O espaço se inspirou em áreas de Nova Iorque e Holanda: o Parque Linear Via Verde, em Jaraguá do Sul
Uma cidade de Santa Catarina possui um modelo recomendado pelo Ministério Público, que possui um grupo de trabalho para diagnosticar, mapear e regulamentar o uso das áreas sujeitas a inundações. O espaço se inspirou em áreas de Nova Iorque e Holanda: o Parque Linear Via Verde, em Jaraguá do Sul.
Espaço de lazer em dias comuns, a área inunda propositalmente em dias de muita chuva. Com amplo espaço verde, ele disponibiliza atrações como ciclovia, praça infantil, academia, pista de skate, quadras para esporte, de concreto e areia, e ainda é possível contemplar, dele, o pôr do sol.
Segundo o promotor de justiça da Defesa do Meio Ambiente de Jaraguá do Sul, Alexandre Schmitt dos Santos, a estrutura foi pensada para suportar as cheias. "Todos os equipamentos implantados aqui são de metal, plástico ou concreto, de modo que, a partir do momento em que o rio baixa, eles podem ser higienizados e se volta a utilizá-los normalmente, sem maiores prejuízos", afirma.
O mecanismo evita que ruas e casas sejam atingidas pela cheia do rio Itapocu, que corta o município, através de uma área de escape da água da enchente, feita a partir da escavação de uma região de pastagem.
Efeitos
Conforme o município, o último trecho da obra foi entregue em 2023, mas a parte alagável, onde o rio espraia, está em funcionamento desde 2019. A prefeitura afirma que a cidade não registra ocorrências graves relacionadas às chuvas desde então.
O chefe de gabinete de Jaraguá do Sul, João Berti, comentou que, só em 2022 e 2023, o município passou por quatro situações que colocaram o funcionamento do parque à prova.
"Os efeitos são sentidos por toda a cidade. O centro da cidade alagava com muita frequência, e não alagou nessas últimas quatro enchentes que tivemos", informou.
A condição do rio, de acordo com o secretário de Obras e Serviços Públicos de Jaraguá do Sul, Otoniel da Silva, é monitorada pelos técnicos da pasta durante os períodos de chuva.
"Quando ele chega à determinada cota, a gente já começa a avisar o setor de trânsito para fazer a interdição da via, e a seguir a gente espera o evento acontecer (o alagamento). Assim que as águas baixam, a gente já mobiliza toda a nossa equipe para fazer a limpeza e entregar o mais rápido possível para os munícipes utilizarem", explica.
Conceito
Professor do departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina, José Ripper Kós destaca que os rios naturalmente possuem áreas de inundação que ocorrem nas cheias.
"Nosso problema é que, com a urbanização, começamos a construir nessas regiões. Os egípcios, por exemplo, usavam essas áreas para plantações justamente porque eram regiões mais férteis devido às cheias do Rio Nilo", explica.
Os parques alagáveis, segundo o professor, especialista em alagamentos nas vias públicas e rios canalizados, são feitos em regiões mais baixas que a área urbanizada para aumentar a sessão alagável do rio e reduzir as chances de a água atingir o nível da área urbanizada.
O que mostram os dados
Dados disponibilizados pela Defesa Civil do município mostram que a área tem ajudado a minimizar os estragos causados por tempestades.
Em 2022, já com o mecanismo em funcionamento, Jaraguá do Sul terminou o ano com 339,3 milímetros de chuva acima do esperado. Apesar disso, o município registrou pouco mais de 20 ocorrências, entre quedas de árvores, deslizamentos e outras sem gravidade. Ninguém precisou sair de casa.
Antes da estrutura ficar pronta, os números eram outros, de acordo com a prefeitura:
- Em 2008, por exemplo, os meses de outubro e novembro registraram, respectivamente, 327,9 e 318,3 milímetros. Na ocasião, foram 1,5 mil pessoas desalojadas, 15 famílias desabrigadas, 7 mil casas atingidas, 15 casas destruídas e 13 mortes.
- Em junho de 2014, o município registrou 280,6 milímetros. Foram 130 pontos de alagamento, e 90 pessoas tiveram de se abrigar em abrigo do município e outras centenas em casas de parentes ou de conhecidos. O município ficou sem fornecimento de água potável por horas. Mais de 50 deslizamentos foram registrados.
- De 6 a 8 de junho de 2011, o município registrou 376 milímetros. 70 mil pessoas foram atingidas pelas cheias (50% do município), 90 pessoas ficaram desabrigadas e centenas desalojadas. Foi atingida 70% da área urbana da cidade.
Inspiração ancestral na China
Em 2012, uma enchente causou a morte de quase 80 pessoas em Pequim, muitas delas afogadas ou eletrocutadas. Casas desabaram e estradas, metrô e até o aeroporto ficaram sob as águas.
No entanto, fotos de turistas tiradas na época mostraram a Cidade Proibida, construída centenas de anos atrás, completamente seca – graças a seu antigo sistema de drenagem.
A tragédia chamou a atenção das autoridades. A China, que viveu intenso processo de urbanização nos últimos anos, passou a ser um dos países a abraçar com mais força novas formas de garantir a drenagem da água. Em Taizhou e Jinhua, por exemplo, muros de concreto que canalizavam rios foram demolidos e substituídos por parques.
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