Em nome de Deus, justifica-se muita coisa. O que é mais estranho, e ao mesmo tempo mais doloroso, é que essa justificativa vem de uma tradição religiosa que prega o amor, a compaixão e o perdão. A Igreja Católica, uma das maiores instituições religiosas do mundo, tem uma longa história de contradições, e talvez nenhuma seja mais dolorosa e óbvia do que a sua relação com a homofobia.
Na Idade Média, a Inquisição foi um período sombrio, no qual as autoridades eclesiásticas, em nome de Deus, cometeram atrocidades contra aqueles que eram considerados hereges, bruxos ou simplesmente diferentes. A tortura, a queima na fogueira e a destruição de vidas humanas aconteceram em nome de uma moral religiosa que se acreditava inquestionável. Sob a capa da fé, muitos foram silenciados, muitos morreram, e as cicatrizes dessa época ainda ecoam em muitos cantos da sociedade atual.
Naquela época, a Igreja defendia a pureza da fé, a rigidez das doutrinas, e qualquer desvio era tratado com violência. A homossexualidade, sendo vista como uma ameaça à moral tradicional, era considerada um pecado imperdoável, e aqueles que se atreviam a viver seu amor fora dos padrões heteronormativos eram muitas vezes punidos de forma brutal. Isso aconteceu em nome de um Deus que pregava o amor ao próximo.
E essa contradição persiste. Hoje, em muitas religiões, principalmente na Igreja Católica, a homossexualidade ainda é vista como algo a ser combatido. Fala-se em “cura” para os gays, como se o amor entre pessoas do mesmo sexo fosse uma doença a ser tratada. O discurso da intolerância se disfarça de moralidade e virtude, mas é impossível não perceber o abismo entre os ensinamentos de Cristo e a postura oficial de muitas instituições religiosas que insistem em excluir aqueles que amam de uma forma diferente.
Mas o que foi a Inquisição senão uma aplicação cruel de um conceito de fé que se distancia do que deveria ser a mensagem central do cristianismo? O que é a homofobia, senão uma repetição da intolerância que já levou tantas vidas à morte, só que agora em nome de um “moralismo” que não se baseia no amor genuíno, mas no medo do diferente?
A Igreja, como qualquer instituição humana, está longe de ser perfeita. Seus erros históricos são incontáveis, e o julgamento das vítimas da Inquisição, assim como o tratamento daqueles que ainda hoje são marginalizados por sua sexualidade, são apenas reflexos de uma moral que muitas vezes se desvia de sua essência. O Deus que prega o perdão e a aceitação não pode ser o mesmo que condena aqueles que amam de maneira distinta.
A verdadeira religião, a que Cristo nos ensinou, não pode ser baseada no medo, na exclusão ou na dor. A fé deve ser um caminho de libertação, não de opressão. E é hora de questionarmos: como podemos continuar defendendo uma moral que perpetua a intolerância e esquece do mais simples dos mandamentos: “Amai-vos uns aos outros”?
Que a história da Inquisição nos sirva como lição, para que nunca mais usemos a religião como justificativa para a violência, para a exclusão, para a morte de sonhos e de pessoas. A verdadeira fé deve ser luz, e não escuridão. Deve abraçar, não excluir. Se a religião prega o amor, que sejamos coerentes com esse princípio e, finalmente, aceitemos todas as formas de amor, sem medo, sem dor, sem contradições.
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