Nem todo pai sabe amar. Nem toda mãe consegue acolher. E não porque não quiseram — mas porque, muitas vezes, também não foram amados do jeito certo. Cresceram ouvindo que carinho era fraqueza, que afeto se comprava com obediência, que limite era grito, que respeito era medo.
Pais feridos, carregando nas costas dores não curadas, histórias não contadas, traumas engolidos a seco. Gente boa, mas machucada. E gente machucada, quando não se cuida, machuca. Não por maldade, mas por repetição.
E aí nascem os filhos.
Filhos que crescem pisando em ovos, aprendendo a decifrar o humor do dia.
Filhos que aprendem a se calar pra evitar conflitos.
Que se tornam fortes antes da hora.
Que viram adultos cheios de dúvidas, tentando entender por que amor, para eles, sempre pareceu condicionado.
Sobrevivem.
Sim, sobrevivem — porque sobreviver é o que sabem fazer.
Aprendem a não esperar muito, a se virar sozinhos, a construir muros onde deveriam haver abraços.
Mas, lá no fundo, carregam um desejo quase infantil: o de ter sido vistos. O de terem sido ouvidos, acolhidos, compreendidos — não só cobrados.
Pais feridos, filhos sobreviventes.
Um ciclo silencioso, mas não imutável.
Porque tem filho que, ao crescer, escolhe diferente.
Que busca terapia, que lê, que questiona, que chora o que nunca pôde chorar.
Filho que decide não repetir. Que ama os próprios filhos com presença, com afeto, com verdade.
Filho que quebra o ciclo. Que entende que honrar pai e mãe não é repetir suas dores — é superar o que eles não conseguiram.
E assim, pouco a pouco, gerações vão sendo curadas.
Porque o amor, quando consciente, tem poder de reconstruir até o que nasceu em ruínas.
Receba outras colunas direto em seu WhatsApp. Clique aqui.