É como colocar uma Ferrari nas mãos de quem mal aprendeu a andar de bicicleta. O Brasil vive um fenômeno bem maluco – e perigosíssimo: se digitalizou antes de se alfabetizar. E isso não é apenas uma constatação tecnológica. É uma ferida aberta nas estruturas sociais, políticas e emocionais do nosso país.
A internet chegou avassaladora. Celulares nas mãos de todos, wi-fi em qualquer boteco, crianças deslizando o dedo nas telas antes mesmo de saberem segurar um lápis. E enquanto os olhos se fixavam nas luzes azuis dos aparelhos, as páginas dos livros iam ficando empoeiradas. Ler? Compreender o que se lê? Formular um pensamento crítico? Ah, isso parece coisa de outro século.
O resultado é alarmante: milhões de brasileiros com acesso às redes sociais, mas sem as ferramentas básicas para interpretar o que veem. Compartilham fake news como quem divide um café; opinam com convicção sobre assuntos que não compreendem minimamente. E o mais assustador: se irritam quando são confrontados com fatos.
É a era do “eu li no WhatsApp”. Da “minha opinião vale mais que os dados”. Do “vi num vídeo, então é verdade”. Criamos uma sociedade de “especialistas em tudo”, sem filtro, sem estudo, sem discernimento.
Mas não é culpa da tecnologia. Ela é neutra, poderosa e até libertadora – quando bem usada. O problema é estrutural. O Brasil ainda tem índices vergonhosos de analfabetismo funcional. E isso não significa apenas não saber ler e escrever, mas sim não compreender um texto simples, não saber fazer uma conta básica, não conseguir identificar o que é verdade ou manipulação.
E isso nos expõe. Nos torna alvos fáceis da desinformação, da manipulação política, dos discursos de ódio travestidos de opinião.
Digitalização sem educação é um prato cheio para o caos.
Precisamos falar sobre isso nas escolas, nas casas, nas igrejas, nos programas de TV. Precisamos urgentemente alfabetizar nosso povo – e não só no sentido literal. Alfabetizar emocionalmente, digitalmente, politicamente. Ensinar a pensar, a questionar, a duvidar com inteligência, a buscar fontes confiáveis.
Porque de nada adianta ter o mundo na palma da mão, se a mente ainda está acorrentada à ignorância.
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