Um dia minha mãezinha disse, com a sabedoria mansa de quem viveu mais do que falou:
“Filha, o teu coração levou nove meses pra ficar pronto. Não deixe ninguém vir e destruí-lo em um dia.”
Na hora, confesso, não entendi a profundidade. Respeitei, como sempre respeitei tudo que vinha dela, mas não absorvi. A gente só compreende certas coisas depois que apanha. E eu apanhei.
Deixei que algumas palavras atravessassem minha pele como navalhas. Deixei que olhares frios congelassem a minha esperança. E, pior: permiti que o descuido do outro fizesse bagunça no meu peito, como se o que me habita fosse um cômodo qualquer.
Demorei pra entender que o coração é obra-prima. Foi tecido devagarinho, com o tempo paciente da gestação. É músculo, é memória, é emoção — e é morada. Não se entrega assim, de uma vez, a quem chega sem tirar os sapatos, sem pedir licença, sem intenção de ficar.
A frase da minha mãe voltou como eco nos dias em que chorei sozinha. Em silêncio, ela me lembrava: “Nove meses, minha filha. Nove.” E foi aí que comecei a guardar melhor o meu coração. Não trancá-lo, não. Mas escolher com mais carinho quem merece entrada.
Hoje eu entendo: ela não falava só de amor romântico. Falava de amizades interesseiras, de promessas vazias, de gente que não sabe cuidar. Falava de mim mesma, às vezes — das vezes em que me sabotei por medo ou carência.
O coração é o que temos de mais sagrado. E embora a gente o ofereça com tanta generosidade, ele não é descartável. Quem não sabe tratar, que não toque.
Agora, antes de me entregar, eu me lembro: o meu coração levou tempo, dor e milagre pra ser o que é. E merece cuidado — pelo outro, sim. Mas, principalmente, por mim.
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