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A confissão do menino calado

23/04/2025 16h20

Quando eu era criança e vendia picolés numa caixinha de isopor, vivi muitas situações difíceis. Uma vez, enquanto segurava a carteira de dinheiro distraidamente, dois meninos passaram de bicicleta e a arrancaram da minha mão. Fiquei ali chorando, sem saber como acertaria as contas com o homem que me fornecera os picolés. Enxuguei as lágrimas e continuei vendendo os poucos picolés que haviam sobrado. Na hora de fechar o dia, fiquei devendo, e o jeito foi pagar com o lucro da venda do dia seguinte.

Naquele tempo, não adiantava chamar a polícia. Certamente eles ririam de mim e diriam que não dava para fazer nada sobre um assunto tão sem importância. Eu tinha apenas onze anos e não contei nada aos meus pais. Eles entenderiam do jeito deles — como se a culpa do roubo fosse minha. Então eu levaria uma surra, um xingamento ou uma mistura das duas coisas. Diante da desesperança de encontrar quem me ouvisse, permaneci calado.

No ano seguinte ao furto da minha carteira, se ainda me lembro bem, fiz a primeira comunhão e me mandaram confessar com o padre. Na verdade, eu nem queria ir. Tinha vergonha de contar qualquer coisa que tivesse acontecido comigo e, para ser sincero, nem conseguia identificar em mim um pecado que comprometesse minha suposta ida para o céu.

Diante do padre, fiquei paralisado. Não sabia o que dizer. Ele então começou a conduzir a conversa, tentando arrancar algum pecado:

— Você alguma vez mentiu para seus pais?

Foi aí que contei sobre a vez em que roubaram a minha carteira. Eu ainda não distinguia direito entre omissão e mentira. O padre então me cortou com um sorriso frio:

— Aqui é lugar para confessar os seus pecados, não para ficar contando os pecados dos outros.

Nunca mais voltei para me confessar. Também não rezei os Pais-Nossos nem as Aves-Marias que ele mandou. Se soubesse que era assim que ele pretendia me oferecer o perdão de Deus, eu nunca teria entrado naquele confessionário e teria seguido a minha vida em silêncio.


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MACIEL BROGNOLI
Crônicas e contos
Maciel Brognoli é guarda municipal de Tubarão, graduado em Administração Pública, especialista em Segurança Pública e Gestão de Trânsito e escritor. Ocupa a cadeira n° 27 da Academia Tubaronense de Letras (Acatul) e escreveu quatro livros.
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