Quando a vi, estava sob a ponte Nereu Ramos. Ela subia lentamente pelo rio, acompanhando o fluxo calmo das águas do Tubarão. Era uma bola de futebol branca, com os gomos desgastados e corroídos — marcas do tempo e das longas horas de brincadeiras em campinhos de chão batido e ruas poeirentas. Fiquei imaginando: de qual criança seria aquela relíquia? Qual cidade ou bairro distante a viu rodopiar sob o sol antes de ser levada pelas águas?
Quem foi o menino que deu o último chute? Será que seus olhos se encheram de lágrimas ao vê-la partir? Será que ele tentou resgatá-la? Ou ficou sentado à margem do rio, triste, observando seu presente de aniversário ser levado para longe, para nunca mais voltar?
Aquela bola sendo arrastada pelo rio Tubarão não apenas me fez imaginar essas possibilidades, mas também despertou em mim memórias da minha infância, vivida na localidade de Canela Grande, no município de Pedras Grandes. Lembrei-me dos dias em que eu e meus amigos jogávamos futebol no pasto da casa do seu Valmor. O terreno, íngreme demais para a prática do futebol, ainda assim era o cenário perfeito para nossa diversão preferida.
Lembro-me de uma tarde agradável, após uma manhã chuvosa, em que chutei a bola com toda a força e fiz um golaço. Mas a trave, feita de galhos de eucalipto, não tinha rede, e a bola, sem limites que a contivessem, rolou morro abaixo, indo ao encontro do rio que serpenteava ao pé do terreno.
Corremos desesperados, rindo e gritando, munidos de galhos improvisados para tentar resgatá-la. Porém, a correnteza, impiedosa e rápida em comparação ao nosso diminuto tamanho, a levou para longe, fora do alcance de nossas mãos e dos nossos olhos. Ficamos ali, impotentes, assistindo à bola desaparecer na curva sinuosa do rio. Em silêncio, chorei. Mas lembro-me de ter desejado, ainda que com tristeza, que, em sua jornada incerta, a bola fosse encontrada por um menino pobre.
Quase quarenta anos depois, em outra cidade e diante de outro rio, revivi aquele momento da minha infância ao ver uma bola de futebol semelhante à que perdi, à deriva, sumindo na curva do Pai Feroz. Mais uma vez, nada pude fazer, apenas observei seu desaparecimento. Onde quer que ela pare, desejo novamente que seja encontrada por um menino pobre. Que esse menino convide seus amigos para jogar futebol no campinho do seu bairro. Que eles sintam a mesma alegria que eu e meus amigos sentíamos nos dias em que jogávamos futebol no pasto do seu Valmor.
Que a tristeza dessa perda se transforme na alegria de um novo encontro.
Feliz Natal!
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