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BLOGS E COLUNAS

Mentiras verdadeiras

23/07/2024 10h07

Nas ocasiões em que desço da viatura para fazer rondas a pé no entorno do Calçadão, sempre aparecem pessoas pedindo informações, lançando denúncias ao vento, reclamando dos desmandos dos governos ou simplesmente querendo bater um papo aleatório.

Não faço distinções entre figurões ou moradores de rua; a todos acolho e ouço com a mesma atenção que desejo para mim: prestativo e educado. Mas é nos idosos que encontro um brilho especial, uma fonte de sabedoria que se derrama sobre mim. Cada palavra deles é uma joia de experiência e, ao fim de cada conversa, sinto-me transformado, enriquecido, um ser humano renovado.

Esta semana, um senhor de idade avançada, caminhando a passos lentos com a ajuda de uma bengala, parou para conversar comigo e já foi logo dizendo:

"Alguém resolveu apelidar a velhice de 'A Melhor Idade'. Obrigado pela gentileza, mas isso é uma verdadeira mentira deslavada!"

"Sabe que o senhor tem razão?" - emendei. "Ainda estou em processo de amadurecimento e posso garantir que, em vários aspectos, meu corpo não responde da mesma maneira que antes. Está vendo aquela placa de trânsito lá na frente?" E apontei o dedo. "Pouco tempo atrás, eu lia cada palavrinha pequena com facilidade. Hoje, tudo fica nublado e embaralhado."

Aquele senhor tinha um senso de humor genial. Olhou sério para mim e disse: "Que placa?"

Nós dois não conseguimos segurar o riso. Então, falei:

"Pelo visto, as imagens começam a ficar nubladas e, conforme os anos passam, desaparecem dos nossos olhos."

Ele riu mais uma vez e falou com humor sobre uma série de desvantagens da velhice. Eu entrei no ritmo dele e disse que era comum meus olhos me enganarem. De vez em quando, eu confundia um galho seco com um pássaro pardo. Até já tinha parado o carro na rodovia para salvar uma pobre e lenta tartaruga que estava no meio da estrada prestes a ser atropelada. A tartaruga era uma pedra.

Ele achou engraçado e falou:

"Está vendo como eu tenho razão? Só tem coragem de chamar a velhice de 'A Melhor Idade' quem ainda não chegou na velhice."

"O senhor está certo! Mas, nesta vida, temos duas opções: morrer jovem ou envelhecer. E para envelhecer é preciso ter muita sorte. Eu espero ter a sorte de chegar à idade do senhor. E, se eu chegar lá, por falta de opção, vou fingir acreditar que é a minha Melhor Idade."

Ele me olhou nos olhos e apertou minha mão. Tive a impressão de que foi embora mais feliz.



MACIEL BROGNOLI
Crônicas e contos
Maciel Brognoli é guarda municipal de Tubarão, graduado em Administração Pública, especialista em Segurança Pública e Gestão de Trânsito e escritor. Ocupa a cadeira n° 27 da Academia Tubaronense de Letras (Acatul) e escreveu quatro livros.
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