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A tragédia de 1974 e as vozes vindas do futuro

24/03/2024 11h36

Naquela tarde de março de 1974, a velha senhora viúva, conhecedora da natureza e sensitiva, sentiu uma fisgada peculiar na perna, uma dor típica que a afligia quando o tempo estava prestes a mudar. Olhou para o horizonte e percebeu que uma chuva densa e duradoura estava por vir.

Seu neto, um menino de cinco anos que brincava no terreiro com um trenzinho feito com latas de sardinha, foi chamado às pressas pela avó: "Passa pra dentro, menino, uma tempestade feia tá pra chegar!" Ela fechou a porta e as janelas cegas da casa simples de madeira enegrecida pelo tempo, e não demorou para o rio flutuante despejar intenso pranto na terra do Pai-Feroz.

Foi tanta chuva que parecia a repetição de uma conhecida história do livro sagrado. O rio Tubarão subiu repentinamente, erguendo-se do leito com toda sua fúria, e então não se viu mais chão na cidade. Tudo se transformou em rio; a água arrastou a casa com a avó e o menino lá dentro.

No momento em que a casa começou a ser levada, a velha e o menino se abraçaram. Apavorados, ouviram por um minuto o badalar compassado do sino de uma igreja. Sem saber do que se tratava, a velha e o menino acreditaram que era o som que as pessoas ouvem quando estão prestes a deixar esta vida.

Coincidência do destino ou não, exatamente 35 anos após a morte do menino, da velha e de centenas de outros tubaronenses, no dia 24 de março de 2009, um dos itens da Lei 3.289/2009, de autoria do vereador Mauricio da Silva, foi posta em prática pela primeira vez em Tubarão.


A lei, entre outras ações, determina que todos os anos, no dia 24 de março, às 15 horas, sons compassados de sinos sejam emitidos durante um minuto para relembrar a tragédia de 1974.


Desde então, todos os anos a Catedral tem usado seus sinos para prestar essa homenagem, o que contribui muito para que as novas gerações conheçam esse triste episódio vivido por nosso povo, e para que os governantes não se esqueçam de suas responsabilidades.

Hoje completa cinquenta anos desde que a velha e o menino ouviram o badalar do sino, um aviso vindo do futuro que não lhes concedeu tempo para interpretações.


Já as vozes de alerta que ecoam em nossos ouvidos atualmente, vindas da 'Senhora Tubarão' do futuro, se repetiram tantas vezes (e de tantas formas) nos últimos anos que se tornaram claras e audíveis: "Façam a dragagem do rio Tubarão para mudar o desfecho de mais uma história triste. Eu estou aqui agora, em um dia que ainda não chegou para vocês, chorando com meu povo por uma tragédia maior do que a de 1974".

Prezados governantes, compreendo que vocês gostam mais de falar do que escutar. No entanto, peço que abram seus ouvidos para ouvir esse conselho da 'Senhora Tubarão'.


Tomem as medidas necessárias, sem preocupações eleitorais, pois somente vocês têm o poder de mudar o final desse evento trágico que ainda não aconteceu. Ainda dá tempo de mudar nosso futuro. Que aqueles que têm ouvidos, ouçam!



MACIEL BROGNOLI
Crônicas e contos
Maciel Brognoli é guarda municipal de Tubarão, graduado em Administração Pública, especialista em Segurança Pública e Gestão de Trânsito e escritor. Ocupa a cadeira n° 27 da Academia Tubaronense de Letras (Acatul) e escreveu quatro livros.
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