Planejado inicialmente para ser uma crítica à falta de cuidados, se assim podemos dizer, do ser humano, em especial alguns com a caneta na mão, em relação às questões ambientais e ao risco iminente que o planeta corre caso nada seja feito, neste campo, de forma imediata, “Não Olhe Para Cima (Don’t Look Up, Netflix, EUA/2021) acabou, por circunstâncias mais do que sabidas e conhecidas, se tornando uma crítica feroz e aberta ao negacionismo de forma geral, e aí, claro, o barulho está feito. E que barulho!
INTERNET EM POLVOROSA
É praticamente impossível, de fato, não relacionarmos de forma direta os acontecimentos do longa com o que, em especial nós brasileiros e os americanos, principalmente na gestão Donald Trump, presenciamos diariamente ao assistirmos a um telejornal, abrirmos um site (sério!), ao lermos jornais e revistas, enfim, ao nos informarmos sobre aquele que é o assunto dominante no planeta nos últimos dois anos: a pandemia de covid-19.
Com esta relação estabelecida, e aí já podemos ter uma ideia do porquê deste filme estar causando tanto frisson, com discussões homéricas na internet, vamos à trama: o cientista e professor universitário Randall Mindy, interpretado magistralmente por Leonardo DiCaprio (pois é, outro dia era um garoto, agora já é um professor…) chefia uma equipe de pesquisadores dentre os quais encontra-se a doutoranda Kate Dibiaski, papel de Jennifer Lawrence, igualmente ótima, e que descobre acidentalmente um cometa gigantesco cuja trajetória o coloca em rota de colisão com a Terra, com o impacto fatal para a humanidade previsto para dali a seis meses.
A partir daí, passamos a acompanhar o esforço dos pesquisadores, cujos estudos foram COMPROVADOS pelas equipes do próprio governo, em demonstrar a gravidade da situação e da obrigatoriedade dos governantes em se tomar atitudes práticas e imediatas para se evitar a extinção. E, como é visto, em vão, pois são ignorados solenemente pela presidente Orlean, papel de Meryl Streep, e que, cá pra nós, é um Trump de saias… ou aquele outro também, de um certo país da América do Sul onde se fala o português, se preferir…
NEGACIONISMO VERDADEIRO
Como toda sátira, gênero cada vez mais raro de se ver no cinema atual, diga-se, “Não Olhe Para Cima” tem alguns exageros. Exageros esses que se veem tanto nos próprios personagens, em uns mais que em outros, e até em algumas soluções apresentadas, e que podem tirar o espectador mais “cri-cri” da história, isso é fato. Por outro lado, é angustiante vermos, e percebermos, que esta mesma história, com todos esses exageros, é totalmente, e infelizmente, real.
Real no sentido, por exemplo, dos conflitos política x ciência, ou economia x saúde… ops, ciência, perdão… do assessor destrambelhado e sem-noção - e por acaso filho da presidente – ora veja que coincidência, comicamente interpretado pelo ótimo Jonah Hill, dentre várias outras situações, transitam por toda a trama, e, como dito, traz calafrios quando lembramos que tudo o que estamos vendo é muito, mas muito, real. De novo, infelizmente.
SERVIÇO
Independentemente de sua posição política, que não é a discussão aqui, a questão negacionista é o mote da produção, explicitada em uma condição extrema como a do cometa, e apresentada através de um texto ácido, provocativo, e que confirma a tendência de “tumultuar”, seja para o bem ou para o mal, que o diretor, e aqui também roteirista Adam McKay, já havia mostrado em obras anteriores (A Grande Aposta, Vice).
Em termos de elenco, estrelado ao extremo, como você pôde perceber, temos ainda a fútil jornalista de Cate Blanchett, o corajoso e insistente cientista Teddy Oglethorpe, papel de Rob Morgan, e o sarcástico e interesseiro Peter Isherwell, uma mistura de Elon Musk com Bill Gates e uma pitada de Steve Jobs e que vê formas de lucrar com o impacto do cometa (!)...
Enfim, de forma superficial, este é o cenário do longa, e os motivos da polêmica por ele causada. Cabe agora a você tirar suas próprias conclusões…
O filme foi exibido em alguns poucos cinemas no início do mês e estreou, de forma global, no catálogo da Netflix, sua produtora, no último dia 24 de dezembro. Boa sessão!